STF impõe prazo para regulamentação da participação de trabalhadores na gestão das empresas
O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o Congresso Nacional regulamente, no prazo de 24 meses, o direito dos trabalhadores urbanos e rurais à participação na gestão das empresas. A decisão, tomada por unanimidade em sessão virtual encerrada no dia 14 de fevereiro, reconhece uma omissão legislativa que se arrasta desde a promulgação da Constituição de 1988.
O julgamento ocorreu no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 85, proposta pela Procuradoria-Geral da República (PGR). O relator, ministro Gilmar Mendes, argumentou que o Legislativo extrapolou o tempo razoável para regulamentar o inciso XI do artigo 7º da Constituição, que prevê a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados e, excepcionalmente, na gestão das empresas.
Desdobramentos e desafios da regulamentação
A decisão do STF cria um cenário de debate sobre como equilibrar os interesses dos trabalhadores e das empresas. A inclusão de empregados nos processos de gestão pode fortalecer a governança corporativa e melhorar o ambiente de trabalho, mas também gera desafios jurídicos e administrativos.
Especialistas alertam que a regulamentação precisa considerar os impactos práticos da participação dos trabalhadores na gestão, garantindo segurança jurídica tanto para empregados quanto para empregadores. “A legislação precisará definir com clareza os limites dessa participação e as responsabilidades decorrentes, para evitar que empresas sejam prejudicadas por decisões que não controlam integralmente”, aponta Cristina Buchignani, sócia trabalhista e sindical do Costa Tavares Paes Advogados.
A participação dos trabalhadores na gestão pode incluir conselhos consultivos, assentos em conselhos administrativos ou outras formas de envolvimento em processos decisórios. No entanto, essa inclusão pode gerar conflitos de interesse e desafios na implementação prática, como aponta Rafaela Sionek, sócia trabalhista do BBL Advogados. “É um avanço que pode trazer benefícios para a cultura organizacional, mas é fundamental que a regulamentação contemple mecanismos para evitar impasses na tomada de decisões e litígios trabalhistas”, explica.
Experiências internacionais e impactos no Brasil
Modelos de participação dos trabalhadores na gestão existem em diversos países, como Alemanha e França, onde empregados podem ter assentos em conselhos administrativos de grandes empresas. Essas experiências demonstram que a inclusão pode melhorar a comunicação interna e reduzir conflitos, mas também exige regulamentações bem definidas para evitar impactos negativos.
No Brasil, a legislação atual já prevê a participação dos trabalhadores nos lucros e resultados das empresas, regulamentada pela Lei nº 10.101/2000. No entanto, a ausência de regras para a gestão participativa tem gerado incertezas sobre como essa prática pode ser implementada de maneira eficaz.
A decisão do STF impõe ao Congresso o desafio de criar uma legislação que equilibre interesses, sem prejudicar a autonomia das empresas. Para isso, a nova norma precisará definir como se dará a participação dos trabalhadores, quais setores serão abrangidos e quais serão os critérios para a tomada de decisões conjuntas.
Próximos passos e impactos no mercado
Com o prazo de dois anos estabelecido pelo STF, o Congresso terá que discutir e aprovar um projeto de lei que regulamente o tema. O debate deve envolver representantes do setor empresarial, sindicatos e especialistas em direito do trabalho, já que a decisão pode impactar o mercado de trabalho e o ambiente corporativo no país.
A regulamentação pode representar um avanço na modernização das relações trabalhistas, mas a sua eficácia dependerá da clareza e viabilidade das regras estabelecidas. Caso o Congresso não cumpra o prazo determinado pelo STF, há a possibilidade de novas ações judiciais para pressionar a regulamentação.
O tema já desperta posicionamentos divergentes entre empresas e trabalhadores. De um lado, há a defesa de que a inclusão na gestão pode melhorar o engajamento e a produtividade; de outro, há receios de que um modelo mal estruturado aumente a burocracia e os riscos jurídicos.
A decisão do STF reforça a necessidade de um debate qualificado sobre a gestão participativa e seus impactos para as empresas e seus funcionários. Enquanto o Legislativo discute a regulamentação, especialistas apontam que o tema deve ganhar relevância nas relações de trabalho nos próximos anos.