Regulação das redes e big techs
Por Anderson Medeiros Bonfim*
05/04/2023 | 03h00
As big techs não se equiparam aos singelos provedores de conteúdos sem impacto sistêmico. Em face delas, não se trata de regular as atividades econômicas e tecnológicas para fins de mera proteção dos direitos fundamentais individualmente considerados, mas o próprio pacto social.
O poder das redes para a formação da opinião pública em temas de sensível relevância social possui efeitos sistêmicos que impõe ao Direito específica reação. Ademais, o armazenamento de dados pessoais de significativa parcela da população e as repercussões, para as relações humanas, da inteligência artificial e dos algoritmos requer das big techs específico compromisso responsabilizatório.
A responsabilidade civil das grandes provedoras de aplicativos sobre conteúdos postados por terceiros, dada a magnitude para as relações sociais e para a vida em sociedade, requer uma regulação eficaz.
Há situações que a desregulação e autorregulação são adequadas à exploração de atividades econômicas. Entretanto, há hipóteses em que a regulação estatal se mostra imprescindível. É ocaso da regulação das redes, isso tendo em vista a posição assumida pelos poderosos provedores de aplicações, os quais devem responder civilmente inclusive por danos decorrentes de conteúdo gerados por usuários, o que inclui a difusão de informações falsas ou atentatórias aos direitos fundamentais.
A comunicação virtual, amparada nas liberdades de expressão e manifestação do pensamento, encontra limites constitucionais. A Constituição, além de garantir da dignidade, a intimidade, a privacidade, a honra e a imagem, também assegura o direito de resposta, o direito ao esquecimento e a indenização por dano material e moral e veda o anonimato. Às big techs não devem ser atribuídas apenas os benefícios dos conglomerados globais, mas a responsabilidade pelo ambiente virtual.
Em tempos de liberdade de expressão, de informação, de comunicação, de opinião e de autodeterminação informativa, são grandes os desafios impostos para a proteção dos direitos fundamentais. A difusão de informações de qualquer natureza e, ainda, o armazenamento de dados pessoais requer compromisso responsabilizatório do poder supranacional das redes.
A exploração de atividades econômicas, ainda que aparente sujeitar-se meramente às regras de livre mercado e aos interesses egoísticos da iniciativa privada, é condicionada pela Constituição.
É a Constituição o elemento responsável pela demarcação das condições e possibilidades das relações econômicas e sociais, cabendo às espécies normativas infraconstitucionais regular a atividade empresarial em busca da preservação dos legítimos interesses em jogo.
Nossa ordem econômica é, dentre outros, fundada nos princípios da livre iniciativa, da propriedade privada e da concorrência, sendo assegurado o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização estatal, ressalvadas hipóteses excepcionais.
Aos referidos princípios se somam, dentre outros, o da função social da propriedade e o da redução das desigualdades sociais. Também não se pode desconsiderar serem fundamentos da nossa República os valores sociais do trabalho, o desenvolvimento, a erradicação da pobreza e da marginalização e, ainda, a redução das desigualdades.
Nesses termos, a projeção a liberdade individual no plano da produção e de apropriação privada não é incondicionada. Ainda que, por um lado, seja desejável a liberdade de exploração privada, bem como a geração e circulação de riquezas propiciada pelas big techs, o desempenho da atividade econômica deve ser balizado por determinados valores inegociáveis.
*Anderson Medeiros Bonfim, doutorando em Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, instituição na qual obteve os títulos de mestre em Direito Administrativo e bacharel em Direito

