Por que Brasil ainda não aderiu ao pacto contra cibercrime?

Por que Brasil ainda não aderiu ao pacto internacional contra cibercrime?

Por Guilherme Mendes

Medida, importante para mundo jurídico, permite que órgãos criminais obtenham informações e provas fora do país.

O Estado brasileiro tem até dezembro de 2022 para ratificar sua entrada na chamada “Convenção de Budapeste”, formulado pelo Conselho da Europa para o combate aos crimes virtuais. O tema ainda está em discussão na Câmara dos Deputados e há debates que indicam sua aprovação no futuro.

Na última segunda-feira (14), a CREDN (Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional) da Câmara dos Deputados debateu o tema, antes de enviar a mensagem do convite à votação. O tom adotado foi de que o Brasil deve sim aderir ao acordo, e que tal discussão é urgente dentro da vida jurídica do país.

“No Itamaraty, chegamos à conclusão de que seria o momento adequado de o Brasil aceitar o convite do Conselho da Europa. Isso daria instrumentos adicionais para os órgãos de persecução criminal obterem informações e provas”, disse Eric do Val Lacerda Sogocio, que chefia a Divisão de Combate ao Crime Transnacional do Ministério das Relações Exteriores. “Também, como parte da convenção, o Brasil passaria a receber o reconhecimento de que suas leis e suas políticas de combate ao crime cibernético e de proteção de dados são compatíveis com normas reconhecidas internacionalmente.”

A diretora do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça, Silvia Amélia Fonseca de Oliveira, também indicou que a adesão do Brasil traria frutos. “O ingresso no comitê faz com que o Brasil e os agentes públicos brasileiros tenham acesso a essa capacitação, aumentando a nossa capacidade interna de enfrentamento aos delitos e reforçando a cooperação internacional”, concluiu.

O general Heber Garcia Portella, que comanda a divisão de Cibersegurança do Exército, apresentou dados que indicaram que um em cada três brasileiros sofreu crimes de fraudes cibernéticas em 2017, e quase nove em cada dez executivos sofreram do mesmo crime.

O texto original da Convenção foi firmado em 2001, na capital húngara.”A Convenção de Budapeste pretende o combate aos crimes cibernéticos num âmbito internacional, estabelecendo como tais as infrações contra a confidencialidade, a integridade e a disponibilidade de sistemas informáticos e dados informáticos, bem como infrações relacionadas com computadores, conteúdo de pornografia infantil e a violação do direito de autor e direitos conexos”, resume a professora e sócia-fundadora do escritório LCS Consultoria e Advocacia, Andrea Costa.

O relator na CREDN é o deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR). Em seu parecer pela aprovação, Rubens assegurou que a convenção respeita a autonomia de cada país e ajuda na harmonização de jurisprudência. “Tais objetivos estão em conformidade com os princípios constitucionais aplicáveis às relações internacionais brasileiras e com o direito internacional”, concluiu, antes de votar pela adesão. Se aprovada pela comissão, deve ir em seguida para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJC) e, em seguida, votada em Plenário Virtual.

Daniel Bialski, sócio do Bialski Advogados, considera que o ingresso do Brasil na convenção vale a pena. “Com certeza, já que os crimes cibernéticos avançam fronteiras e sem uma efetiva cooperação internacional o combate é diminuto e limitado”, ponderou. “Caso o Brasil se torne um dos signatários da Convenção de Budapeste a cooperação com os demais países será mais efetiva, célere e terá uma forma preestabelecida para ocorrer dentro dos ditames legais, sempre resguardando a soberania nacional.”

O criminalista André Damiani, sócio-fundador do Damiani Sociedade de Advogados, elogiou os esforços já feitos pelo Estado brasileiro. “O Brasil tem buscado avançar no assunto segurança digital. Prova disso, a LGPD inseriu o Brasil no seleto grupo de países que possuem legislação específica sobre tratamento de dados dos usuários”, comentou.

A advogada e colaborada da Metzker Advocacia, Jessica Boldi, também julga positiva a proposta. “Embora o Brasil conte com certa repressão aos cibercrimes, a adoção à peça confere uma maior segurança em relação aos novos caminhos a serem alcançados para a prevenção e repressão”, disse. “Além disso, sairá da esfera nacional e contará com apoio internacional para a matéria.”

O criminalista Luís Felipe D´Alóia, do Bialski Advogados, considera que a LGPD ( Lei Geral de Proteção de Dados) é um grande avanço legislativo sobre o tema – mas que ainda não trata de questões delitivas cobertas pela convenção – ela alcança apenas a responsabilização civil e administrativa de quem guarda os dados. A legislação brasileira, no então, não deixa o tema descoberto.

“Por exemplo, o Código Penal em seus artigos 154 e 154-A trata, respectivamente, da violação de segredo profissional e da invasão de dispositivo informático, que são crimes que podem ser apenados com até 4 anos de prisão”, lembra o advogado. “Além destes exemplos, o próprio Código de Defesa do Consumidor, no ponto em que trata das infrações penais, descreve como crime, apenando-o com até 1 ano de prisão, impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros.”

É a mesma opinião de Iara Peixoto Melo, que é head da equipe de data protection do Chenut Oliveira Santiago Advogados. “O Brasil dispõe de alguns mecanismos para combate ao cibercrime, como por exemplo a Lei 12.737/2012, popularmente chamada de ‘Lei Carolina Dieckmann’”, lembra Iara. “De toda sorte, a LGPD colabora na prevenção de crimes, uma vez que elenca regras para o tratamento de dados, evitando vazamentos e com isso buscando diminuir a ocorrência de ilícitos. Isso ocorre porque os dados coletados e inadequadamente armazenados constituem farto arsenal para o cometimento de crimes”, completa a associada do Damiani Sociedade de Advogados, Flávia Bortolini.

https://br.lexlatin.com/reportagens/por-que-brasil-ainda-nao-aderiu-ao-pacto-internacional-contra-cibercrime


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