Mutilação genital feminina: Mais uma faceta da violência de gênero

Mutilação genital feminina: Mais uma faceta da violência de gênero

Por: Cecília Mello, Flávia Silva Pinto Amorim e Marcella Halah Martins Abboud

A MGF é uma prática cultural violenta e cruel, denunciada por ativistas como Waris Dirie e combatida mundialmente por direitos humanos.

Introdução

Em 6/2/14, Ban Ki-Moon, à época secretário-geral da ONU – Organização das Nações Unidas, em discurso proferido por força do Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital, chamou atenção sobre a importância desse problema, eis que a mutilação genital feminina, prática atentatória aos direitos humanos, ainda permanecia presente em muitos países.

Naquela ocasião, Ban Ki-Moon fomentou a luta para erradicação da mutilação genital feminina, cuja tradição ceifara, até então, cerca de 200 milhões de mulheres e meninas, conforme o Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância, em inglês UNICEF – United Nations International Children’s Emergency Fund:

“Devemos nos esforçar para preservar o melhor em qualquer cultura, e deixar o mal para trás. Não há razão em termos de desenvolvimento, religiosa ou de saúde para cortar ou mutilar qualquer menina ou mulher. Embora alguns argumentem que esta é uma ‘tradição’, devemos lembrar que a escravidão, os chamados crimes de honra ou outras práticas desumanas foram definidas sob o mesmo fraco argumento. Só uma prática prejudicial existe há muito tempo, isso não justifica a sua continuação. Todas as ‘tradições’ que rebaixam, humilham e ferem são violações dos direitos humanos que devem ser ativamente opostas até que sejam terminadas”.

Passados oito anos daquela data, o cenário segue preocupante.

A mutilação da genitália feminina (representada pela sigla MGF, em inglês, FGM – female genital mutilation) “compreende todos os procedimentos que envolvam a remoção parcial ou total da genitália externa feminina ou outras lesões aos órgãos genitais femininos, quer por razões culturais, quer por outras razões não-médicas ou não terapêuticas.” (tradução nossa). Da leitura da definição desse procedimento (compreendido como uma prática essencialmente de cunho cultural), se denota a pertinência do alerta feito por Ban Ki-Moon.

A gravidade do tema também ganhou destaque mundial com a história da ativista Waris Dirie, que sobreviveu a graves mutilações e conseguiu se desvincular da realidade a que foi submetida durante anos. Waris Dirie nasceu em uma família nômade na área de Galkaio, na Somália, e fugiu aos treze anos para a cidade de Mogadíscio com o objetivo de escapar de um casamento arranjado com um homem de sessenta anos.

Somado a isso está o episódio por ela vivido, aos cinco anos de idade. A ativista foi acordada pela mãe no meio da noite e conduzida a um local afastado: naquele momento, mediante a utilização de uma lâmina de barbear quebrada, uma mulher se aproximou da criança e a mutilou.

Após conseguir fugir, Waris Dirie trabalhou em Londres durante anos, com baixa remuneração, até ser descoberta, aos dezoito anos, pelo fotógrafo Terence Donovan. Em 1987, a ativista foi fotografada com Naomi Campbell, à época desconhecida. Esse foi o marco inicial da sua atuação como modelo. No ano de 1997, auge de sua carreira, Waris Dirie “revelou à jornalista Laura Ziv, da revista Marie Claire, sobre a mutilação genital que ela tinha sofrido aos cinco anos de idade, junto com suas irmãs, e passou a atuar junto à ONU em campanhas pela abolição da prática.”

Em 1998, em coautoria com Cathleen Miller, a ativista escreveu a autobiografia Desert Flower (Flor do Deserto) que se tornou best-seller e foi adaptado para o cinema em 2008: “além dele, lançou outros livros, Desert dawn (Alvorecer no deserto), Letter to my mother (Carta para minha mãe) e Desert children (Criança do deserto), o último dos quais lançado em uma campanha contra a mutilação genital.”.

A ativista liderou campanha internacional contra a mutilação genital feminina, fundou a Desert Flower Foundation (Fundação Flor do Deserto), que arrecada recursos financeiros para escolas e clínicas na Somália, bem como organizou diversas campanhas na União Europeia para erradicar a prática entre imigrantes.

A partir da história de Waris Dirie, é possível obter uma noção, ainda que distante da vivência ocidental, a respeito da necessidade de o tema ser mais conhecido. As nefastas consequências acarretadas a meninas e mulheres submetidas a essa injustificável barbaridade revelam a importância de se conclamar pelo emprego de esforços conjuntos no combate da mutilação genital feminina.

Clique aqui para ler a íntegra do artigo.

Cecília Mello – Advogada criminalista, desembargadora federal aposentada e sócia do Cecilia Mello Advogados.

Flávia Silva Pinto Amorim – Advogada pós-graduada em Ciências Criminais.

Marcella Halah Martins Abboud – Advogada mestranda em Direitos pela PUC-SP.

Leia em Migalhas


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